UM POUCO DA HISTÓRIA DA BORRACHA – post
A borracha já era conhecida dos índios antes do descobrimento da América. Em 1525, P. d’Anghieria relatou ter visto os índios mexicanos jogarem com bolas elásticas. Charles de la Condamine foi o primeiro a fazer um estudo científico sobre a borracha, que ele conhecera durante viagem ao Peru, em 1735. Um engenheiro francês, Fresnau, que la Condamine havia encontrado na Guiana, estudara a borracha no local e concluíra que esta não era senão “uma espécie de óleo resinoso condensado”.
O primeiro emprego da borracha foi como apagador. Foi Magellan, descendente de célebre navegador, quem propôs este uso. Priestley, na Inglaterra, difundiu-o e a borracha recebeu em inglês o nome de “India Rubber”, que significa “Raspador da Índia”. A palavra borracha teve sua origem numa das primeiras aplicações úteis deste produto, dada pelos portugueses, quando foi utilizada para a fabricação de botijas, em substituição às chamadas borrachas de couro que os portugueses usavam no transporte de vinhos.
Macquer, retomando os trabalhos de la Condamine, pela primeira vez indicou o modo de fabricação de tubos flexíveis de borracha. Desde então numerosos artesãos se interessaram pela borracha: o ourives Bernard, o boticário Winch, Grossart, Landolles, e outros. Em 1820 um industrial inglês, Nadier, fabricou fios de borracha e procurou utilizá-los em acessórios de vestuário. Por essa época começou a reinar na América a febre da borracha: os calçados impermeáveis dos índios faziam sucesso. Produziam-se tecidos impermeáveis e botas de neve na Nova Inglaterra.
Em 1832 foi criada a fábrica de Rosburg. Infelizmente, as alterações que os artefatos de borracha natural não vulcanizada sofriam sob a influência do frio, tornando-se quebradiços, e o inconveniente de aderirem-se uns aos outros se ficassem expostos aos raios de sol, desinteressaram os consumidores. Após tentar desenvolver por longo tempo um processo para o melhoramento das qualidades da borracha (incorporação de ácido nítrico, por exemplo) e ser levado à ruína, Goodyear descobriu acidentalmente, em 1840, a vulcanização.
Um fato curioso: em 1815, Hancock, modesto serralheiro, tornou-se um dos maiores fabricantes do Reino Unido. Ele havia inventado um colchão de borracha e, associado a Mac Intosh, fabricava as famosas capas impermeáveis “mac intosh”. Além disso, havia descoberto e realizava industrialmente o corte, a laminação e a prensagem da borracha. Tinha verificado a importância do calor na prensagem e construído uma máquina para este fim.
Mac Intosh descobriu o emprego da benzina como solvente e Hancock preconizou a prévia “mastigação” e aquecimento, para obter uma perfeita dissolução da borracha. Hancock descobriu também a fabricação de bolas elásticas. Por fim, Hancock, em 1842, de posse da borracha vulcanizada de Goodyear, procurou e encontrou o segredo da vulcanização, fazendo enorme fortuna.
Em 1845 R.W. Thomson inventou o pneumático, a câmara de ar e até a banda de rodagem ferrada. Em 1850 fabricavam-se brinquedos de borracha, bolas ocas e maciças (para golfe e tênis). A invenção do velocípede por Michaux, em 1869, conduziu à invenção da borracha maciça, depois da borracha oca e, por último, à reinvenção do pneu, pois a invenção de Thomson havia caído no esquecimento. Payen estudou as propriedades físicas da borracha, do mesmo modo que Graham, Wiesner e Gérard.
Finalmente, Bouchardt realizou a polimerização do isopreno, entre 1879 e 1882, obtendo produtos de propriedades semelhantes à borracha. O primeiro pneumático para bicicleta data de 1830. Em 1895 Michelin teve a idéia audaciosa de adaptar o pneu ao automóvel. Desde então a borracha passou a ocupar um lugar preponderante no mercado mundial. Sendo a borracha importante matéria-prima e dado o papel que vem desempenhando na civilização moderna, cedo foi despertada a curiosidade dos químicos para conhecer sua composição e, posteriormente, sua síntese. Desde o século XIX vêm sendo feitos trabalhos com esse objetivo, logo se esclarecendo que a borracha é um polímero do isopreno.
Os russos e os alemães foram os pioneiros nos trabalhos de síntese da borracha. Mas os produtos obtidos não suportaram a concorrência da borracha natural. Somente com a Primeira Guerra Mundial a Alemanha, premida pelas circunstâncias, teve de desenvolver a industrialização de seu produto sintético. Foi o marco inicial do grande desenvolvimento da indústria de borrachas sintéticas, ou elastômeros, no mundo.
A Borracha Natural – NR
A Borracha Natural é o produto sólido obtido pela coagulação de látices de determinados vegetais, sendo o principal a Hevea Brasiliensis. Essa matéria-prima vegetal, proveniente da planta conhecida vulgarmente como seringueira, é nativa da Amazônia. Embora seja grande o número de espécies que por uma incisão na casca exsudam secreção de aspecto semelhante ao látex, somente algumas produzem quantidade e qualidade suficientes para exploração em bases econômicas.
A história da borracha natural no Brasil é um enredo que pouco fica a dever à corrida do ouro americana. Por quase cinqüenta anos, da segunda metade do século XIX até a segunda década do século XX, a borracha natural sustentou um dos mais importantes ciclos de desenvolvimento do Brasil. Naquela época, a revolução industrial se expandia velozmente e o mundo vivia período histórico de prosperidade e descobertas que se refletiam em todos os setores. Automóvel, bonde, telefone, luz elétrica e outras inovações mudavam paisagem e costumes nas cidades. Novos mercados se abriam. Era a belle époque, cujo esplendor a literatura e o cinema se encarregaram de retratar para as gerações seguintes.
Devido a suas múltiplas aplicações, principalmente na indústria automobilística em expansão, a borracha obtida a partir do látex das seringueiras tornou-se produto mundialmente valorizado. E seringueiras não faltavam na Amazônia brasileira. Isso levou a região Norte do Brasil, uma das mais pobres e desabitadas do país, a experimentar período de grande prosperidade. Interessadas na exploração dos seringais amazônicos, grandes empresas e bancos estrangeiros instalam-se nas cidades de Belém e Manaus.
A capital amazonense torna-se o centro econômico do país. Ganha sistemas de abastecimento d’água, luz elétrica, telefone, grandes construções, como o Teatro Amazonas, até hoje símbolo da riqueza advinda da borracha. Milhares de imigrantes, principalmente nordestinos fugidos da seca da década de 1870, invadem a floresta para recolher o látex e transformá-lo em borracha.
A produção amazônica chega a 42 mil toneladas anuais e o Brasil domina o mercado mundial de borracha natural. Esse clima de euforia dura até 1910, quando a situação começa a mudar: a partir daquele ano entram no mercado as exportações de borracha a partir das colônias britânicas e o Brasil não suporta a feroz concorrência que lhe é imposta.
Em 1876, os ingleses haviam contrabandeado sementes de hevea brasiliensis da Amazônia para o Jardim Botânico de Londres. Lá, por meio de enxertos, desenvolvem variedades mais resistentes, que posteriormente são enviadas para suas colônias na Ásia – Malásia, Ceilão e Cingapura – onde tem início uma exploração intensiva da borracha natural.
A diferença técnica de plantio e extração do látex no Brasil e na Ásia foi determinante para os resultados da exploração como negócio. Enquanto a distância entre as seringueiras na Ásia era de apenas quatro metros, na Amazônia caminhava-se às vezes quilômetros entre uma árvore e outra, o que prejudicava e encarecia a coleta. Obviamente, as plantações racionalizadas do Extremo Oriente proporcionaram significativo aumento da produtividade e se tornaram mais competitivas. No Brasil, o governo resistia a mudar os métodos. Acreditava que a exploração da maneira que era feita assegurava a presença de brasileiros e garantia a soberania nacional sobre a despovoada região amazônica. Privilegiava-se a geopolítica, representada pela ocupação, em detrimento da geoeconomia, que poderia render melhores frutos.
A relativa imobilidade custou caro para o país: as exportações brasileiras perderam mercado. Não suportaram a concorrência da borracha extraída na Ásia, muito mais barata. Como conseqüência, a produção entrou em declínio. Ali chegava ao fim o período de prosperidade vivido pela extensa região Norte do Brasil. As empresas que haviam se instalado em Manaus e Belém saíram em busca de outras regiões mais produtivas. Os imigrantes voltaram para suas terras. Os grandes nomes das artes mundiais já não se apresentavam no Teatro Amazonas. A opulência cristalizara-se em História.
No final dos anos 20, o Brasil ainda tentaria uma reação com a ajuda de um parceiro inusitado: o industrial norte-americano Henry Ford, idealizador de uma nova forma de produzir que marcaria a indústria para sempre – a linha de montagem – e responsável, na época, por 50% da produção mundial de veículos. Com a intenção de acabar com o controle do mercado de borracha – a preciosa matéria prima dos pneus – pelas colônias inglesas do Sudeste Asiático, Ford plantou nada menos que 70 milhões de mudas de seringueira numa área de um milhão de hectares no Pará.
O ambicioso projeto foi logo batizado pelos moradores da região como Fordlândia. Pretendia produzir 300 mil toneladas anuais de borracha natural, quantidade que representava a metade do consumo mundial. Mas Ford sucumbiu às adversidades e ao ambiente hostil da floresta amazônica. Abandonou tudo, amargando enorme prejuízo.
Neste contexto a Ásia dominou o suprimento mundial de borracha natural, com mais de 90% da produção. Mudanças importantes, no entanto, têm redistribuído a produção entre os principais concorrentes. A Malásia, que em 1985 respondia por 1/3 da produção mundial, reduziu sua participação. Isso decorreu da mudança no seu perfil de produção, que passou a dar ênfase em investimentos não-agrícolas. A Tailândia ocupou o lugar de maior produtor mundial de NR. A Indonésia – com vantagens de área e mão-de-obra disponíveis – tem mantido participação relevante na produção mundial desde a década de 80.
Outros países que vêm se valendo, com sucesso, do potencial de mão-de-obra barata e disponibilidade de terras para crescimento nesse setor são a Índia e a China. O consumo de borracha natural representou, em 2001, cerca de 40% do total de borrachas consumidas no mundo.
A Borracha Sintética
A importância que ganhou a indústria da borracha desde seu surgimento e o papel decisivo que assumiu no descortinar da civilização moderna, despertou o interesse pela descoberta da sua composição química e, depois, pela síntese. A indústria de pneumáticos via, nas pesquisas, a possibilidade de se independer das plantações mundiais de borracha natural.
O declínio da produção de borracha natural no Brasil coincide com o período da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e com a necessidade de se obter produto mais barato, com suprimento mais seguro para a fabricação de pneus. A pressão decorrente da tomada das plantações asiáticas pelos japoneses levou ao desenvolvimento de uma borracha que, embora de estrutura diferente da natural, satisfazia extraordinariamente a alta demanda requerida pelas tropas na época
Foi assim que surgiu a GR-S, Buna S, Hycar OS ou SBR, um copolímero de estireno e butadieno. Foi o marco inicial do grande desenvolvimento da indústria de borrachas sintéticas. O produto desenvolvido era facilmente vulcanizável e acabou se transformando no carro-chefe da indústria da borracha mundial, apesar de suas propriedades não corresponderem a todas as qualidades da natural. Mas o custo e as características principais foram determinantes para que se tornasse concorrente imbatível. Apesar da borracha sintética já ser conhecida desde 1875, sua produção até este momento era cara e inexpressiva.
Episódio histórico importante, durante a Segunda Guerra Mundial, mudou o cenário desse mercado. Na manhã do dia 7 de dezembro de 1941 os Estados Unidos entraram na guerra. Três meses após o ataque a Pearl Harbor, os japoneses, desesperados para controlar a produção de borracha natural, assim como os aliados, tomaram a Malásia e as Índias Orientais holandesas. Assumiram o controle de 95% do suprimento mundial do produto e mergulharam os EUA numa crise.
Cada tanque Sherman continha 20 toneladas de aço e meia tonelada de borracha. Cada navio de guerra era constituído de 20 mil partes de borracha. A borracha era usada para recapear cada centímetro de fio em todas as fábricas, lares, escritórios e instalações militares na América. Não havia alternativa sintética. Levando-se em conta todas as fontes possíveis, a nação tinha, mantidos os níveis normais de consumo, estoques para cerca de um ano. Essa reserva tinha ainda de alimentar a maior e mais crítica indústria em fase de expansão da história mundial: a indústria bélica.
A resposta de Washington foi rápida e dramática. Quatro dias depois de Pearl Harbor, o uso da borracha em qualquer produto não essencial para a guerra foi proibido. O limite de velocidade nas estradas americanas caiu para 35 milhas por hora, para diminuir o desgaste dos pneus em todo o pais. As raspas de borracha eram vendidas a um penny ou mais por libra peso em mais de 400 mil depósitos em todo o país. Até Fala, o cão do presidente Franklin Roosevelt, teve seus brinquedos de borracha derretidos. Foi a maior campanha de reciclagem registrada na história e assegurou o êxito dos aliados até 1942.
Nessas circunstâncias, foi emitida uma ordem a todos os químicos e engenheiros para que desenvolvessem uma indústria de borracha sintética. Em 1941, a produção total de borracha sintética era de pouco mais de 8 mil toneladas, principalmente produtos que não serviam para a fabricação de pneus.
A sobrevivência da nação dependia da sua capacidade de manufaturar mais de 800 mil toneladas de produtos que mal haviam começado a ser desenvolvidos. Não havia muitas instruções detalhadas de como as fábricas deveriam se organizar para produzir essa gigantesca quantidade. Não haviam sido construídas instalações nem sequer para produzir a matéria-prima necessária à produção de borracha.
A indústria americana nunca havia sido convocada a assumir tarefa como essa. Conseguir tanto em tão pouco tempo. Os engenheiros tinham dois anos para alcançar a meta. Se o programa da borracha sintética não obtivesse êxito, a capacidade dos americanos para prosseguir na guerra estaria ameaçada. O esforço americano ajudaria a disseminar a borracha sintética nos mercados mundiais, inclusive no Brasil, que após a Guerra tratava de consolidar o seu parque industrial.
Principal rota de produção de borrachas
Uma variedade muito ampla de borrachas sintéticas foi desenvolvida desde a descoberta do produto. Como foram grandes os investimentos requeridos para o desenvolvimento das diversas variedades, a tecnologia para a produção foi bastante concentrada em tradicionais empresas de porte global, como DuPont, Bayer, Shell, Basf, Goodyear, Firestone, Michelin, EniChem, Dow, Exxon e Texas Co.
O emprego da borracha é muito amplo, pois as características e propriedades que os elastômeros reúnem fazem com que alcancem praticamente todos os setores da economia: automobilístico, calçadista, construção civil, plásticos, materiais hospitalares e outros também de grande importância no dia-dia da sociedade. Por serem as mais empregadas na produção de pneus, as SBRs e as BRs são as de maior consumo entre as sintéticas.